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Retorno às audiências trabalhistas presenciais obrigatórias – de volta para o… passado?

Atualizado: 17 de abr. de 2023

Com particular surpresa, na sexta-feira passada (21/10), os profissionais da área jurídico-trabalhista receberam o Ato nº 35 da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho, no qual revogaram-se vários atos anteriores que regulavam a realização das audiências trabalhistas por videoconferência. Dentre os revogados, consta o Ato nº 11/GCGJT de 2020, que regulava a realização, registro e armazenamento das audiências telepresenciais no processo trabalhista.

No universo trabalhista, hoje, o quadro é de um certo temor: retornaremos aos tempos antigos de audiências necessariamente presenciais?


Há 3 anos, caso um oráculo anunciasse que em futuro próximo as audiências se realizariam por videoconferência – como regra geral – no processo do trabalho, nenhum advogado ou juiz trabalhista acreditaria. Atualmente,

enxerga-se com certa dificuldade algum futuro processual das audiências desvinculado totalmente da tecnologia de transmissão instantânea de áudio e vídeo.


A transmutação procedimental da Justiça do Trabalho ao regime telepresencial de atos judiciais, com a implementação de audiências por tele e videoconferência, foi de assustadora rapidez e rápida absorção.

Obviamente, não sem alguma revolta daqueles acostumados ao trato pessoal presencial e caloroso com juízes, partes e testemunhas; mas de outro lado, também revelando o alívio dos que, por força de sua atividade, não mais precisariam deslocar-se por grandes distâncias para a realização de solenidades que, por vezes, não ultrapassariam 5 minutos de duração.


Seja como for, o Direito do Trabalho e seus estudiosos sempre imprimiram suma importância à prova processual produzida de forma oral. Os juízes trabalhistas tornam-se, com a prática procedimental, hábeis inquiridores e avaliadores da conduta humana. Os advogados especializados na área, a seu turno, aprenderam a questionar, de maneira perspicaz, as testemunhas e partes. E, em um primeiro momento, a videoconferência pareceu desmantelar a crença pessoal dos operadores em suas próprias técnicas. “E se a testemunha estiver lendo

respostas em outro monitor? E se, na mesma sala ou em ambiente anexo, houver pessoa ditando as respostas ao depoente? Terá o mesmo impacto psicológico na testemunha depor por meio de um celular ou desmoraliza a

Justiça e facilita o ato de mentir? O que acontece caso a conexão de internet falhe durante o ato?” Todos esses eram (e ainda são) questionamentos que permeiam a audiência telepresencial.


Com o tempo e a prática – e em razão da necessidade forçada pela pandemia Covid-19 – as audiências por videoconferência lograram algum sucesso e o mistério que as envolvia foi-se dissipando.


Com o armazenamento dos depoimentos em áudio e vídeo, por exemplo, pode-se rever toda a prova produzida na audiência, reavaliando a conduta dos magistrados de base, das partes, testemunhas e advogados em sede recursal. Qualquer incidente durante a audiência, quando gravado, dificilmente passará despercebido.


As pessoas eventualmente impedidas de depor (por força da distância física, enfermidades ou compromissos de cuidado com outrem), podem testemunhar por seu celular ou notebook, com facilidade. No que parece um longínquo passado, havia a necessidade de pedir a outro Juiz para escutar a pessoa inserida geograficamente em localidade de sua jurisdição (carta precatória). Se a pessoa a ser escutada residisse em outro país, então, mal se

sabia se seria possível tomar seu depoimento, considerando a dificuldade de cumprimento das cartas rogatórias.


Ilustrativamente, as chamadas audiências iniciais, cujo único fim era a aproximação das partes e realização de acordo e que, muitas vezes, tornavam-se verdadeiro sofrimento para atarefados juízes e advogados (diante do desinteresse conciliatório dos litigantes) foram extirpadas da prática processual do direito processual de

emergência.


A virtualização dos atos processuais, outrora presenciais é, sem dúvida, o futuro inevitável do processo. Dado o avanço dos tempos de “quarta revolução industrial”. a realidade humana está em veloz transformação e não parece razoável estancar a exitosa prática processual brotada em razão da calamidade sanitária, para aguardar sua implementação “oficial” por meio de enxertos na lei processual e/ou na CLT.


Há vantagens e prejuízos a serem sopesados para alcançar-se resposta definitiva sobre a matéria, o que não foi possível realizar quando da eclosão da pandemia, forçando a adaptação dos mais conservadores e obrigando a implementação célere de métodos próprios para a realização das audiências em novo formato (o possível para aquele momento). A maturidade das condutas de partes, procuradores e servidores do Poder Judiciário nos novos espaços digitais já está consolidada e introjetada, inclusive na interpretação de clássicos como boa-fé e cooperação processual.

Resta a dúvida se, vez que já aberta a caixa de pandora, tentará o Judiciário Trabalhista simplesmente fechá-la ou buscará soluções para a superação dos eventuais percalços ainda existentes, viabilizando a digitalização do processo, o que, essencialmente, o democratiza?


*Denise Pires Fincato, pós-doutorada em Direito do Trabalho na Universidad Complutense de Madrid; doutora pela Universidad de Burgos; mestre pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos; professora-pesquisadora no PPGD da PUCRS; acadêmica titular da Cadeira nº 34 da Academia Sul-Rio-Grandense de Direito do Trabalho; coordenadora do Projeto de Pesquisa em cooperação acadêmica (Projeto Rede): “Crise, Tecnologia e Relações de Trabalho: eficácia e efetividade da Constituição e dos Direitos Fundamentais no Direito Público e no Direito Privado”; advogada e consultora trabalhista, sócia fundadora de Denise Fincato Advogados


*Bóris Chechi de Assis, doutorando em Direito na PUCRS. Mestre em Direito e Ciência Jurídica e pós-graduado em Ciências Jurídico-Laborais pela Universidade de Lisboa. Professor convidado no Curso de Pós-Graduação em Processo Civil da PUCRS. Advogado trabalhista, sócio sênior em Denise Fincato Advogados. Professor e autor de obras jurídicas.


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